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O Egoísmo, em trajes de gala,
vestiu, com galhardia,
o Sentimento.
Desde então, deste não mais se desfez:
é convidado de honra nos bailes da alta roda.
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quinta-feira, 23 de dezembro de 2010
Baile de Máscaras
Dia Febril
Acompanham as horas crepusculares
Do dia inacabado em mim,
Inconcebivelmente inacabado em mim.
Há espasmos e sussurros
Provindos da viela que desemboca
No leito insone do espírito.
Há orgasmos, bombas e gases
Fundindo-se no universo ático
Da carne sórdida e fútil.
Perfilados e persignados,
São vagos os instintos
A se manifestar na tarde cinza
De meu dia febril.
Padece a massa disforme,
O desejo sem rosto, cor ou casca,
O presente e derradeiro instante,
Fugazmente recolhido pela inércia dos gestos,
Enquanto me consome o dia,
Infindo dia, absurdo.
Sim,o candeeiro aceso do amanhã
Ou ao menos as luzes da noite vindoura.
Já não me sustentam as órbitas
Nem os passos nem os braços trêmulos
Do hoje interminável,
Inconcebivelmente interminável em mim,
Indefinidamente meu.
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quinta-feira, 2 de dezembro de 2010
Literatura Barata
Compusessem discursos,
Apregoassem pechas e sistemas,
De nada adiantaria:
É cedo demais para ser todo,
O tempo é de menos no caos de tudo.
O passado ruminante impregnou-se nas paredes,
As chagas vivas corroem,
Misturam-se ao bolor dos móveis da casa de hoje
De outrora.
A palavra de comiseração,
Amiga,
Amarga,
Amarela-se no riso,
Aflito,
Pungente,
Impacientado pela fila do banco,
Pela porta fechada contra o rosto.
O tapinha cúmplice nas costas,
Atenuante do crime,
Legitima o mito de que somos irmãos,
Que os fatos, os medos,
Os freios e os escrúpulos
Permeiam indiscriminadamente a existência,
Aquela que deliberou descrever-se
Pela literatura barata,
De respostas assopradas ao pé do ouvido,
Da mesa posta.
Ainda assim de nada adiantariam
Os gritos na amurada do edifício,
O pranto nas escadarias da igreja,
A fome esganiçada no colo de alguém:
Antes houvesse tempo
No caos de tudo,
Antes não fosse cedo
Para ser-se todo.
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sexta-feira, 12 de novembro de 2010
Tratado
e cala:
é teu inteiro o que, em ti,
silencia.
Faze de si próprio, lenho:
Abrasado,
que o seja de todo
violado,
que o seja no ato
concebido,
no lar de teu leito
infinito,
se o mar de teu fado.
Todo, enfim,
saber-lo-á em ti,
e depreenderá a gota frívola
que se lhe escapa dos tratados
de amor perfeito,
Absoluto.
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quinta-feira, 11 de novembro de 2010
Passamento
quinta-feira, 28 de outubro de 2010
Litania da Finada Esperança
E agora?
Não era ela a última a morrer?
Sim, mas, de fato, não morreu.
Aliás,este consolo.
Sabes que ela voltará,
Como sabes!
Voltará sorrindo
E com este sorriso,
Persistirás:
Incorrerás novamente no erro,
Nas promessas, sabes bem,
És paciente do ambulatório central
De Almas do Desterro.
Tens boa memória,
Lembras das falácias
Que tu próprio te rogaras
Tal litania em procissão.
O que farás?
És agora homem,
Não gente, que disso estás longe,
Não tens a quem recorrer.
O que te circunda
É ínfimo perto do que dentro te revolta.
Mas não te preocupes,
Estás a caminho,
Chegarás em breve,
Amigo.
Ela te acompanha,
Fiques tranquilo.
À hora
Em que dobra a esquina
E parece que te vira as costas,
Não te espantes.
É só mais um de teus rompantes
Que a fez esconder-se.
Agora, amigo,
Descansa.
Não tarda o trem que esperas,
O das metáforas em que te imiscuis.
Isso tudo nele vai,
E volta,
É dele a matéria de que és feito,
É nos seus trilhos que te revelas.
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quinta-feira, 21 de outubro de 2010
Periódico
Favas às traças.
Consumados, saberemos adiante
Desinflados os egos
Apaziguados os ânimos
Surgidos os destroços
Reparados que seriam, se possíveis fossem.
Recolhidos os cascos
Reinará a limpeza:
Asseado, passado e engomado
Destreza dos homens
Séculos de experiência.
Apagado o incêndio
Varrerão as migalhas
Pra debaixo dos canos
Rede de intrinca
Perdurando anos afinco
A fim de que não se esqueça
Não se perca a cabeça!
Especialmente por reentrâncias
Revisitadas no leito de mocidade.
Passadas as vacas dadas
Sobrará a perder revista
Atualidades, gêneros alimentícios etc. etc. etc.
E festa, em festa
Estarão os pobres do socorro
Calçando, orgulhosos, alpercatas multicolores
Dançando roda com bondosos senhores
Engenho ardiloso
Destreza das mãos
Ressequidas do tempo.
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sexta-feira, 15 de outubro de 2010
Solitude
Espreitou-me da porta
Agarrou-me na soleira
Quando eu tentava fugir
A solidão
Fingiu-se de morta
Nas cinzas de quarta-feira
Do carnaval a se despedir
Passou o cometa
A vida-instante
A estrela cadente
A última constelação
E o que foi que eu vi?
Ah solidão, velha companheira
Amiga das linhas tortas
Em que me inscrevi
Foste tão minha como nenh'outra
Minha, minha, mil vezes minha...
Partilhamos, desde sempre
A ausência
O silêncio
O segredo
O salão de festas abarrotado
E o copo vazio
Corpo sozinho
Teu retrato
Tela desfeita.
Ah solidão
Se soubesses que nada importa
Que tudo é besteira
Que se vê por aí!
Ah solidão
Diz-me, zombando, tanto mais que corta
A sua triste maneira
De me sorrir.
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quarta-feira, 29 de setembro de 2010
Destino
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
Considerações
Não há razão para alarde:
Eu convalesço há anos
Na cama da indecisão.
Por certo não esperam que eu seja completamente avesso
Às convenções e modismos sociais:
É impossível caminhar sobre brasas
Sem ao menos sentir os pés chamuscarem.
Os outros,os da moda,
Penso que me veem com desprezo
E até faço gosto.
Caridade interessada tem braços curtos,
Mãos atarracadas nos bolsos falsos
Dos casacos de risca dos conspícuos homens envernizados.
Qual a minha opinião?
Só sei que ignoro a maior parte
Daquilo que presumo conhecer
E nímias são as dúvidas que me acometem
Frente à clareza do destino a se desencilhar por meus nós.
Senão,de que outra forma cometeria eu os mesmos erros?
Perdi as contas de quantas vezes mudei,
De quantas vezes fui o que era conveniente,
De quantas vezes fui frase-feita,
A resposta [in]sensata aprendida nos bancos de praça,
Nas autoajudas do portão da frente,
Nos balcões de botica de cidade pequena:
Mera força de expressão,
Cínica abnegação.
Querem realmente que eu diga o que se passa?
Tudo não passa de uma reles mentira,
Do início ao fim.
Eu adormeço há anos
Na cama da ilusão.
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segunda-feira, 13 de setembro de 2010
Letargia
Quer-se somente a rede e o tiritar da chuva no telhado.
As frases intelígiveis
São aquelas ditas quando do cerrar de pálpebras
Em que, semi-consciente, recitam-se versos melancólicos
De um poeta morto no século escuro.
Nada lhe pertence.
O ar por sobre o corpo
Envolve-o na lenta dança de lascivos pensamentos.
Nada lhe socorre.
Nada pergunta.
Deixa-se:
Necessita de espaço.
Novamente, distinguem-se as cores,
Alvas e altas.
Entrementes,um voo de pássaro
Rasante, rascante, cortando a brisa
Sibilando por entre árvores de insólitos galhos
A pender maçãs rubras tal faces juvenis,
Fazendo de um bater de asas, ordinário que só,
Ópera.
É, portanto, a paz almejada.
Chá das Cinco
E, à seca que se me invade pela garganta,
Deixando terra e descontentamentos,
Respiram úmidos lábios
Da moça ainda virgem de mim.
De que me servem estes [des]alentos
Aviltados por ignaras rédeas tomadas
D'outras mãos, que não as minhas?
Dantes mo disseram à maneira:
Pobre diabo vestido em firmamento,
Metido à besta.
Então, hão de desmentirem-me?
Hão de serem-me devotos?
Sabe-se lá o que confabulam
Os que pensam,
Pois deles invejo a hipócrita rotina de bem,
Eu hipócrita no agir.
Oxalá venham ter em minha casa
Um chá de vindas.
Ser-lhes-ei anfitrião
De chapéu e botas [sujas]
No quinto badalar da tarde,
À moda inglesa.
sexta-feira, 3 de setembro de 2010
1,2,3 salve o mundo!
Éramos crianças.
Havia a ideia vaga
De que um toque no pique
Salvaria o mundo.
Não de forma literal,
Óbvio.
Mas de forma mais pura,
Creio que impossível.
Encondíamo-nos,
Corríamos,
Formávamos alianças secretas
Inquebrantáveis,mesmo sob promessas
De recompensa por colaboração:
-Eu não sou dedo-duro!
Os corações tamborilavam em uníssono,
Aflitos de serem auscultados
Se por outra sorte batessem.
Caía-se a noite pelas varandas
Das casas preguiçosas,
E os velhos observavam aqueles
Que um dia foram.
Foram junto com o tempo.
Vieram as rugas,as amarguras
E os arrependimentos,
Ainda que insistam em dizer que fariam tudo igual,
Com as mesmas vírgulas e reticências
Outrora condenadas.
Voltávamos para a casa
E,a nossa espera,
O banho preparado,
O café-com-leite,
O bolo que a mãe pajeava
Na tarde quente do ano bom,
Pois todos os anos eram bons,
E as tardes,que se não chovem,
Eram azuis e boas.
À cama,erguiam-se muralhas
Derrubadas a um sopro,
Herois de espada e força
Venciam dragões de ferro e fogo.
Éramos João Sem Medo*
A vestir-se de fantasma
Para assombrar vilões.
Éramos Bobuque*
A colocar dias em nomes
E encher de alegria os castelos abandonados.
Natural era dizer a verdade,
Falar o que vinha à cabeça,
Aprender,às escondidas,
Palavrões que o irmão mais velho ensinava,
Pular o muro do vizinho
Atrás da bola que se perdeu.
Salvar o mundo?
Bastava uma simples contagem.
Éramos qual um pequeno deus de vontade
A brandir seu cajado,
Fazendo com que a Terra toda estremecesse
Ao seu sinal:
1,2,3 salve o mundo!
Éramos o que se queria ser.
Éramos crianças.
(* Referência aos livros infantis "As Aventuras de João Sem Medo", de José Gomes de Ferreira, e "As Batalhas do Castelo", de Domingos Pellegrini, respectivamente.)
terça-feira, 24 de agosto de 2010
Diário
O corpo reluta
O frio fustiga
O sono, renitente
Caminha ao lado
Caminha?
As mãos tremem
O espelho reverbera
A luz fosca
De um rosto inane
De fato
Tudo vai mal
Vai?
(Se fizesse sentido
Se tivesse tempo
Se soubesse da vida...)
Reconhece a sombra
Debaixo dos pés
Conforma-se
Ir assim
Pisando na sombra
Para não tropeçar
Ir?
Faz as pazes
Torna a brigar
Criança eterna que é
Não sabe ouvir
Não!
O dia é fogo-fátuo
Carente de luzir
Correndo desabaladamente
Rua acima
Das tristezas noturnas
Correndo?
Cogita
As ações encabuladas
Tímidas
À meia-voz anunciadas
Pelos alto-falantes
Encabulados
Da estação detrás do morro
(Sempre haverá quem ouça
As preces benditas)
Agitam-se bandeiras
Enquanto segue o cortejo
De pedras e desejos
No coração dos homens.
quinta-feira, 19 de agosto de 2010
Ratos [e livros]
Num bairro obscuro da cidade,
Onde divido meus livros com os ratos.
São ótimos inquilinos.
Contentam-se com qualquer migalha,
Raramente abrem a boca pra reclamar.
Trazem de vez em quando um amigo,
Nada que um pedaço a mais de pão-de-ontem não dê jeito.
Enquanto escrevo,eles roem.
A convivência é pacífica,
Quase não há brigas.
Na estante do cômodo ao qual chamo de sala
(Na verdade,é uma extensão do banheiro),
Avolumam-se livros e desesperanças,
Cada qual inacabado a seu modo:
Os livros,abandono-os logo no início:
A modorra pela vida
Predispõe-se à fome.
As desesperanças,entreguei-as ao ego,
Que as trata de rechaçar veementemente:
Ele ainda acredita.
Abro minhas últimas anotações:
Exilei-me à procura de paz,
Entretanto,neste quarto barato num bairro obscuro da cidade,
Só encontrei ratos.
E livros.
Mas destes e daqueles,principalmente daqueles,
Não posso reclamar:
São ótimos inquilinos.
Fazem-me companhia à beira da janela nos finais de semana.
Conferimos a vida alheia pelas frestas que escapam dos andares inferiores.
Conversamos sobre mulheres,futebol,amenidades:
"Será que chove?",pergunto.
"O tempo anda seco,uma boa chuva não seria de mau grado",respondem.
Revelaram-se sábios.
Como eu,fogem das frases feitas.
Pena refugiarem-se nos lugares-comuns.
Quanto aos livros,mantém-se calados.
Como eu,querem tanto falar...
[Quem os ouviria? Quem me ouviria?]
Pena não serem compreendidos.
Sentado numa velha poltrona
No meu quarto barato
No bairro mais obscuro da cidade,
Eu escrevo.
A chuva esperada resolveu cair,
Irrompendo pelos buracos do teto.
Sobre minha cabeça,
As gotas deslizam.
Uma vontade súbita de chorar.
Com os olhos marejados,
Já não sei se é chuva ou se são lágrimas
A escorrer pelo rosto.
Eu continuo a escrever.
Ao fundo,um ruído:
São os ratos,
A roer.
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
Sonetito
A saudade que em ti se despe,
Guarda mistérios do que nunca vi.
Calhou-me ser o que dela se veste,
Amante tolo de pedra rubi.
No exato instante em que tu distas,
As dores põem-se a gargalhar.
Dos amores são as egoístas,
Todo ouro para si querem guardar.
E, vendo-te bela, ao longe,
Nos verdes campos da memória,
É como sentir que o amor me foge.
Morando, reclusa, no castelo da estória,
És tu dama que o fogo não forje,
És tu e por si, tua glória.
Para que tantas, Vírgulas?!
sexta-feira, 23 de julho de 2010
Saudade
Dissona tanto de tua voz falada...
E ressona,
E ressoa,
E revoa,
E revê, em mim,
O recôndito.
Teu beijo de água doce
Adorna meus olhos insones...
E aquece,
E esquece,
E apetece,
Qual prece
De um pagão adido...
sexta-feira, 16 de julho de 2010
Julho
sábado, 10 de julho de 2010
Exaltação a Baudelaire
Embriagar-me-ei de poesia
Que,de virtude,quase não as tenho
A taça quedou-se vazia
Primavera sem flor de meu Setembro
Embriagar-me-ei de poesia
E de mil versos embevecidos
Esvair-se-ão meus dias
Folhas de um Outono caído
Embriagar-me-ei de poesia
O tinto que me destes
Acalentou-me à noite fria
Levou-me as monções do leste
Embriagar-me-ei de poesia
O grito é o que me basta
Serão minhas palavras vadias
A vagar por ruas castas
quinta-feira, 8 de julho de 2010
Banquete
quarta-feira, 7 de julho de 2010
Mundo dos Negócios
segunda-feira, 28 de junho de 2010
Encantamento
menos de cego:
Não é por não ver que te amo.
Amo-te por fazer-me enxergar,
circundada por tantas galáxias:
Vênus:
Revestida de fogo e leveza
imarcescível facho dissonante depreendido de ti
paisagem de um município distante
no centro da Terra.
Não é com os olhos que te diviso
é com o sentido do universo
com as narinas impregnadas de sua visão ardente, insinuante
o caminho de meus dedos a tocar a área limítrofe
entre seu corpo e minha alma
região fronteiriça
emaranhando penhascos e abismos
junto a desejos suicidas.
Mas somos nós incólumes corações à vertiginosa queda
incautas razões por onde se perdem as causas
e se descobrem as inúmeras pagas
vaticinadas ao primeiro toque
ignoradas ao primeiro beijo
e reveladas ao inesperado desfecho:
Encantamento.
Sabemos, então, do que somos feitos:
Desejo.
Apercebemo-nos, então, do que nos foi tácito:
Deslumbramento.
E assistimos, incrédulos, ao nosso eterno martírio
de sermos incólumes corações
comandados por incautas razões.
sábado, 26 de junho de 2010
Fuga
quinta-feira, 24 de junho de 2010
Pílula
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Deram-me o mundo
E o que dele podia fazer
Não fiz.
E o meu mundo sem fundo
Escrevi por não saber
Na parede, com giz.
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quarta-feira, 23 de junho de 2010
Resignação
Do que tenho
Faço pouco
O que sonho
Julgo louco
O que pressinto
Pensamento distinto
Do que embalo
Inútil regalo
Fração inóspita do meu povoado:
- Abandonado!
Fonte insípida de meu pranto vencido:
- Combalido...
Há que ser grande, há que ser grande!
À vitória
Futura e outorgada
Rendo-me, enfastiado
À glória
Obscura e negada
Acedo, lisonjeado
Há que ser grande para ser Gente!
Há que ser grande para ser Gente!
segunda-feira, 21 de junho de 2010
Armistício
Por favor,hoje,não!
Ao menos um dia em toda vida
Quero ter o direito de dizer "não"
Deixem-me ser egoísta sem remorsos
Ser mesquinho e fútil
Controverso e falso
Ser essência,nem que seja uma vez
Para ser inteiro,uma única vez:
Que meus erros sejam apontados em cada esquina
Que minhas falhas estampem as fachadas
Que minha imagem seja devassada,manchada,obliterada
Que meus defeitos,meus incomensuráveis defeitos
Aticem,instiguem,alinhavem os ódios mal contidos,as desconfianças,as certezas escusas
E depois de todo mise-en-scéne habitual
Atirem-me ao olvido,à indiferença
Ao verdadeiro padecimento
Do solista sem aplausos
Da dama sem os lúbricos olhares
Do pobre sem os piedosos gestos.
Só quero dormir
Dormir um sono profundo de quase morte
(os sonhos,não me falem em sonhos!
a realidade já me é demasiado fantasiosa)
Dormir e acordar apenas no ponto final
Como quem viaja pelo mundo
À procura de casa
Querer a verdade
E, por ser verdade
Não haver consciência que lhe pese
Que nem a sós digo toda a verdade
Se há alguma a ser dita
Mas hoje,apenas hoje
Deixem-me ser o que sou
Sem sorrisos,sem cumprimentos
Somente casca,somente superfície
Oca e estéril essência
Única e possível forma.
terça-feira, 15 de junho de 2010
Idílio
Queria-te sempre menina
Menina de teus poucos anos
Menina de teus muitos sonhos
Ver-te sempre menina
Ver-te sempre como vejo-te hoje
Imaginar-te menina e pura
Pura sem dizer palavra
Menina com as letras do mundo
Longe de olhos e bocas
Imagem concreta e sutil
Apenas de sentimento
Andar pela alameda de teus braços
Sentir o vento a balouçar-te os cabelos
Ser o hálito doce da hortelã
Que jaz em tua boca
Contar-te histórias pela manhã
Do que outrora pertencera a ti
Sem que ainda o soubesses
E não ser mais do que teu
Não ser mais do que metade
Meio de tudo que te completa
Raiz a prender-te ao solo
Folha de copa a fazer-te perder o medo
A mostrar-te do que és capaz
Mesmo pequena, mesmo menina
Ver-te sempre menina
E não ter que ver-te mulher
Vale inalcançável do norte
Rebentação dos mares do sul
Ser sempre pequena
Para ter-me ao teu lado
Menino de pés rotos
Menino que nada sabe
De tuas pétalas incultas
segunda-feira, 14 de junho de 2010
[Aos] Vinte
Ideias revoltosas
Ideologia sem base
Anarquismo conservador
Socialismo,sim! [só na calçada]
Por fora
Beleza discreta
Por dentro
Oco,opaco,amorfo
Revoluções pela metade
Levantes que ficaram a meio caminho
"La Résistance Indestructible!"
-Finada ao primeiro tiro
Aos outros
Alegria ensejada
A si
Tristeza desmedida
Doses diárias de autoajuda
Pagas [e com hora marcada]
Reflexões de última hora
Idiossincrasia de uma ditadura:
Ser todo ignorado
Ou tolo compreendido?
-Dilema.
[Aos] Vinte.
sábado, 12 de junho de 2010
Bicicletas
O que você faz a essa hora na rua?
Isso são horas de um garoto estar na rua?
A essa hora da noite e andando de bicicleta,
Veja se tem cabimento!
Um frio desses e você em mangas de camisa...
Assim,vai pegar um resfriado!
Ê garoto!
Se eu fosse você,
Eu iria dormir.
Se eu fosse você,eu tomaria um banho
E iria dormir.
Se eu fosse você,eu provaria da sopa quente da mãe
E iria dormir.
Pensando bem...
Se eu fosse você,eu seria um chato!
Ah,quer saber?!
Vá andar de bicicleta!
Esqueça-se da cama,do banho,da sopa,
Esqueça-se de dormir,
Porque quem dorme fica velho
E os velhos são chatos,
Como eu.
Como eu?!
É,preciso de uma bicicleta...
sexta-feira, 11 de junho de 2010
Prelúdio
Penso que seja melhor o compromisso
Mais até do que a promessa
Não nos esquecendo,é claro,das premissas
Deixadas [doravante] como indício
Já que me atenho ao fado
De redigir,sem desagravo
Algumas torpes palavras de agrado
Ao nosso nunca desdito caso
Que se findou,'inda que pranteado
Asseguro-lhes que haverá combate
Devaneios imersos no tatibitate
Da objetiva moderna,o disparate
De ideias escapulindo pela lente retrátil
Imagem retinta na retina,debalde
E,assim,por fim,enfim
Dou mostras daquilo que esperam de mim:
Nada além do comum
Pouco mais que algum
Sinal de ser pensante
Andarilho,errante
Nas cordas da Divina Arte.
quinta-feira, 10 de junho de 2010
Carta I
Creio que escrever, para ele, era mais um exercício de autoexperimentação, quem sabe, autoafirmação. Sentia-se mais seguro na terceira pessoa, mais "eu" em outrem, menos contundente nas falhas e mais cônscio de suas virtudes. Talvez isso ocorresse pela dificuldade de se descrever a si próprio, pela incapacidade de dizer algo em voz alta, de se fazer ouvir. Nas palavras, um refúgio. Nos poemas, um grito. Fosse pelo que fosse, era-lhe confortável estar entre letras, mesmo que delas não fizesse o devido proveito ou conseguisse expressar o exato sentimento. De certo, só sabia que seu destino era estar entre elas, sua vontade, viver rodeado por elas e seu medo, perdê-las de vista. Para quem se achava perdido, tinha certezas de sobra. Para quem tinha tantas dúvidas, era inimaginável ter alguma certeza. Por ora, estar perdido era ter um caminho, um apoio, uma saída. Por ora, isso era tudo o que ele podia se oferecer.
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