Eram meus olhos nos seus: eles, seus olhos, calmos e claros, azuis e lejos, os meus inquietos, temerosos. E, fitando-nos, falamos, maravilhados por nossas presenças naquele quarto, naquele instante, quase como se quiséssemos estreitar no peito algum desejo insano que, por ventura, nos permitisse uma sobrevida até a próxima semana, quem sabe, ou mês, que quedaria eterno nas lembranças fugazes de ontem, anteontem, de um ano atrás... como se escutássemos uma música lenta, baixando sobre nossas cabeças e ouvidos ávidos por torpores desconhecidos até então e, imponderadamente, fosse-nos permitido avançar pela pista de dança que luzia apenas para nós dois... como se sonhássemos, eu, em vigília, com seus olhos azuis, lejos, você com suas façanhas, seus projetos concretos, abstraída pelo futuro insondável, e nesse sonho entrelaçássemos as mãos, inocentes, distantes de quaisquer vertigens do corpo. Naquele mesmo instante fugidio, como que acordando de um sonho em vigília, percebi que pertenciam somente a mim as imagens daquele quarto, as esperanças daquela noite. E como lutasse e não conseguisse detê-la por mais um instante, desses infinitos, vi esfumar-se entre meus braços, no abraço, seus olhos azuis: antes, agora e cada vez mais lejos.
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